quinta-feira, 12 de novembro de 2009

Assunção Duarte - parágrafo inicial

Conhecia-o desde sempre. Ele tinha estado em todos os funerais a que eu assistira na aldeia. Era um lugar onde se morria pouco e, quando acontecia, ele tornava o acontecido num verdadeiro evento. O seu lugar era sempre do lado direito da cova que abrira no dia anterior. Em todos a ocasiões vestia um fato escuro impecavelmente limpo e, com um ar sério e solene, ficava a aguardar o sinal do padre para baixar o caixão. Naquele dia eu senti que o estava a ver pela primeira vez. Sereno o seu rosto transmitia uma paz surpreendentemente pura. Capaz de me fazer invejar o que quer que fosse que lhe passava pelo pensamento. A voz grave do padre percorria sem obstáculos o ar límpido da manhã, mas não o suficiente para abafar o sussurro que percorria o povo que viera assistir ao enterro: O coveiro está a enterrar o próprio filho, diziam. E nem uma lágrima ele deita!

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